Ficha de Leitura: Dialogismo, polifonia, intertextualidade – BARROS, Diana L. P. ; FIORIN, José L.

BARROS, Diana L. P. ; FIORIN, José L.  (Orgs.) Dialogismo, polifonia, intertextualidade. São Paulo, SP: Edusp, 1999

 

 


RONCARI, Luiz. Prefácio. In: BARROS, Diana L. P. ; FIORIN, José L.  (Orgs.) Dialogismo, polifonia, intertextualidade. São Paulo, SP: Edusp, 1999

“Bakhtin soube diferenciar bem as dinâmicas que regulavam o plano da vida da produção dos bens materiais e o plano da vida da produção dos bens simbólicos. Sem desconhecer nem negar as relações entre um e outro, entendia que, se a dialética hegeliana poderia desenhar bem o movimento do primeiro plano, o segundo precisava de uma outra figura. Dialogia foi o termo que mais usou para descrever a vida do mundo da produção e das trocas simbólicas, […] como um universo composto de signos, do mais simples, como dois paus cruzados formando uma cruz, até os enunciados mais complexos, como a obra de um grande pensador como Marx, cujos valores e significados não eram dados e estáticos, mas extremamente ambíguos e mutáveis. Nele, tudo o que era simples poderia se tornar complexo e o que era complexo se tornar simples (justamente o que veio a ocorrer na história da cruz e do marxismo), o vivo morto e o morto vivo, o novo ser expressão do velho e o velho do novo, enfim, nesse universo nada era definitivamente dado, porque tudo poderia vir a ser, inclusive o seu contrário.” (RONCARI, Luiz. Prefácio. In: BARROS, Diana L. P. ; FIORIN, José L.  (Orgs.) Dialogismo, polifonia, intertextualidade. São Paulo, SP: Edusp, 1999, p. X)

“Assim, se a história das informações sociais e da vida da produção material do homem conhecia um movimento que poderia ter sentido, na medida em que as mais novas superavam e anulavam as mais velhas; na história da vida das formas simbólicas nada era inteiramente superado e esgotado” (RONCARI, Luiz. Prefácio. In: BARROS, Diana L. P. ; FIORIN, José L.  (Orgs.) Dialogismo, polifonia, intertextualidade. São Paulo, SP: Edusp, 1999, p. X)

“Devemos dizer que o relativismo e o dogmatismo excluem igualmente qualquer discussão, todo diálogo autêntico, tornando-o desnecessário (o relativismo) ou impossível (o dogmatismo)” (BAKHTIN apud RONCARI, Luiz. Prefácio. In: BARROS, Diana L. P. ; FIORIN, José L.  (Orgs.) Dialogismo, polifonia, intertextualidade. São Paulo, SP: Edusp, 1999, p. XI

“De certa forma, esse universo do conhecimento e da vida ideológica, ele percorreu como um peregrino, como quem não conhecia fronteiras, regiões interditas ou proibidas, nem marcas intransponíveis, pois as únicas efetivas eram as das línguas e linguagens que se enraizavam profundamente em formações culturais específicas” RONCARI, Luiz. Prefácio. In: BARROS, Diana L. P. ; FIORIN, José L.  (Orgs.) Dialogismo, polifonia, intertextualidade. São Paulo, SP: Edusp, 1999, p. XI


BARROS, Diana L. P. Dialogismo, polifonia e enunciação. In: BARROS, Diana L. P. ; FIORIN, José L.  (Orgs.) Dialogismo, polifonia, intertextualidade. São Paulo, SP: Edusp, 1999

“O exame da enunciação ocupa espaço privilegiado em suas reflexões, Bakhtin concebe o enunciado como matéria linguística e como contexto enunciativo e afirma ser o enunciado, assim entendido, o objeto dos estudos da linguagem.” (BARROS, Diana L. P. Dialogismo, polifonia e enunciação. In: BARROS, Diana L. P. ; FIORIN, José L.  (Orgs.) Dialogismo, polifonia, intertextualidade. São Paulo, SP: Edusp, 1999, p. 1)

“Sua definição de enunciado aproxima-se da concepção atual de texto. O texto é considerado hoje tanto como objeto de significação, ou seja, como um ‘tecido’ organizado e estruturado, quanto como objeto de comunicação, ou melhor, objeto de uma cultura, cujo sentido depende, em suma, do contexto sócio-histórico. Conciliam-se, nessa concepção de texto ou na ideia de enunciado de Bakhtin, abordagens externas e internas da linguagem. O texto-enunciado recupera estatuto pleno de objeto discursivo, social e histórico.” (BARROS, Diana L. P. Dialogismo, polifonia e enunciação. In: BARROS, Diana L. P. ; FIORIN, José L.  (Orgs.) Dialogismo, polifonia, intertextualidade. São Paulo, SP: Edusp, 1999, p. 1)

“Sua obra caracteriza-se fundamentalmente pela visão de conjunto do texto. Critica fortemente as análises parciais, sejam elas internas ou externas, e prega a análise do todo do texto: de sua organização, da interação verbal, do contexto ou do intertexto. (BARROS, Diana L. P. Dialogismo, polifonia e enunciação. In: BARROS, Diana L. P. ; FIORIN, José L.  (Orgs.) Dialogismo, polifonia, intertextualidade. São Paulo, SP: Edusp, 1999, p. 2)

“O autor acredita que o monologismo rege a cultura ideológica dos tempos modernos e a ele opõe o dialogismo, característica essencial da linguagem e princípio constitutivo, muitas vezes mascarado, de todo discurso. O dialogismo é a condição do sentido do discurso.” (BARROS, Diana L. P. Dialogismo, polifonia e enunciação. In: BARROS, Diana L. P. ; FIORIN, José L.  (Orgs.) Dialogismo, polifonia, intertextualidade. São Paulo, SP: Edusp, 1999, p. 2)

“Bakhtin concebe o dialogismo como princípio constitutivo da linguagem e a condição do sentido do discurso. Examina-se, em primeiro lugar, o dialogismo discursivo, desdobrado em dois aspectos: o da interação verbal entre o enunciador e o enunciatário do texto, [e] o da intertextualidade no interior do discurso” (BARROS, Diana L. P. Dialogismo, polifonia e enunciação. In: BARROS, Diana L. P. ; FIORIN, José L.  (Orgs.) Dialogismo, polifonia, intertextualidade. São Paulo, SP: Edusp, 1999, p. 2)

“concebe-se o dialogismo como o espaço interacional entre o eu e o tu ou entre o eu e o outro, no texto. Explicam-se as frequentes referências que faz Bakhtin ao papel do ‘outro’ na constituição do sentido ou sua insistência em afirmar que nenhuma palavra é nossa, mas traz em si a perspectiva de outra voz. (BARROS, Diana L. P. Dialogismo, polifonia e enunciação. In: BARROS, Diana L. P. ; FIORIN, José L.  (Orgs.) Dialogismo, polifonia, intertextualidade. São Paulo, SP: Edusp, 1999, p. 3)

“o sujeito deixa de ser o centro da interlocução que passa a estar não mais no eu nem no tu, mas no espaço criado entre ambos, ou seja, no texto. Descentrado, o sujeito divide-se, cinde-se, torna-se um efeito de linguagem, e […] encaminha a investigação para uma teoria dialógica da enunciação” (BARROS, Diana L. P. Dialogismo, polifonia e enunciação. In: BARROS, Diana L. P. ; FIORIN, José L.  (Orgs.) Dialogismo, polifonia, intertextualidade. São Paulo, SP: Edusp, 1999, p. 3)

“Outro aspecto do dialogismo a ser considerado é o do diálogo entre os muitos textos da cultura, que se instala no interior de cada texto e o define […] [:] ponto de intersecção de muitos diálogos, cruzamento das vozes oriundas de práticas de linguagem socialmente diversificadas” (BARROS, Diana L. P. Dialogismo, polifonia e enunciação. In: BARROS, Diana L. P. ; FIORIN, José L.  (Orgs.) Dialogismo, polifonia, intertextualidade. São Paulo, SP: Edusp, 1999, p. 4)

“o texto […] tal como Bakhtin o entende: tecido polifonicamente por fios dialógicos de vozes que polemizam entre si, se completam ou respondem umas às outras. Afirma-se o primado do intertextual sobre o textual: a intertextualidade não é mais uma dimensão derivada, mas, ao contrário, a dimensão primeira de que o texto deriva. (BARROS, Diana L. P. Dialogismo, polifonia e enunciação. In: BARROS, Diana L. P. ; FIORIN, José L.  (Orgs.) Dialogismo, polifonia, intertextualidade. São Paulo, SP: Edusp, 1999, p. 4)

“Deve-se observar que a intertextualidade na obra de Bakhtin é, antes de tudo, a intertextualidade ‘interna’ das vozes que falam e polemizam no texto, nele reproduzindo o diálogo com outros textos” (BARROS, Diana L. P. Dialogismo, polifonia e enunciação. In: BARROS, Diana L. P. ; FIORIN, José L.  (Orgs.) Dialogismo, polifonia, intertextualidade. São Paulo, SP: Edusp, 1999, p. 4)

“Propusemos, em outros trabalhos, o exame narrativo da enunciação, na tentativa de reconstruir as ideologias do texto e concebemos, na esteira de Bakhtin, o contexto como uma rede de textos da cultura que dialogam de modo contratual e conflitante(BARROS, Diana L. P. Dialogismo, polifonia e enunciação. In: BARROS, Diana L. P. ; FIORIN, José L.  (Orgs.) Dialogismo, polifonia, intertextualidade. São Paulo, SP: Edusp, 1999, p.5)

“Emprega-se o termo polifonia para caracterizar um certo tipo de texto, aquele em que se deixam entrever muitas vozes, por oposição aos textos monofônicos, que escondem os diálogos que os constituem. Reserva-se o termo dialogismo para o princípio constitutivo da linguagem e de todo discurso.” (BARROS, Diana L. P. Dialogismo, polifonia e enunciação. In: BARROS, Diana L. P. ; FIORIN, José L.  (Orgs.) Dialogismo, polifonia, intertextualidade. São Paulo, SP: Edusp, 1999, p. 6)

“o diálogo é condição da linguagem e do discurso, mas há textos polifônicos e monofônicos, segundo as estratégias discursivas acionadas. […] Monofonia e polifonia de um discurso são, dessa forma, efeitos de sentido decorrentes de procedimentos discursivos que se utilizam em textos, por definição, dialógicos. Os textos são dialógicos porque resultam do embate de muitas vozes sociais; podem, no entanto, produzir efeitos de polifonia, quando essas vozes ou alguma delas deixam-se escutar, ou de monofonia, quando o diálogo é mascarado e uma voz, apenas, faz-se ouvir” (BARROS, Diana L. P. Dialogismo, polifonia e enunciação. In: BARROS, Diana L. P. ; FIORIN, José L.  (Orgs.) Dialogismo, polifonia, intertextualidade. São Paulo, SP: Edusp, 1999, p. 6)

“Considerou-se um discurso autoritário aquele em que se abafam as vozes dos percursos em conflito, em que se perde a ambiguidade das múltiplas posições, em que o discurso se cristaliza e se faz discurso da verdade única, absoluta, incontestável. Para reconstruir o diálogo desaparecida são, nesse caso, necessários outros textos que, externamente, recuperem a polêmica escondida, os choques sociais, o confronto, a luta. (BARROS, Diana L. P. Dialogismo, polifonia e enunciação. In: BARROS”, Diana L. P. ; FIORIN, José L.  (Orgs.) Dialogismo, polifonia, intertextualidade. São Paulo, SP: Edusp, 1999, p. 6)

“Discurso poético, por sua vez, é aquele que instala internamente, graças a uma série de mecanismos, o diálogo intertextual, a complexidade e as contradições dos conflitos sociais.” (BARROS, Diana L. P. Dialogismo, polifonia e enunciação. In: BARROS, Diana L. P. ; FIORIN, José L.  (Orgs.) Dialogismo, polifonia, intertextualidade. São Paulo, SP: Edusp, 1999, p. 6)

“procedimentos de criação de ambivalência ‘carnavalesca’ […] operam uma releitura do mundo. Reformula-se o mundo pelo discurso, vê-se a realidade sob novos prismas, refaz-se o ‘real’” (BARROS, Diana L. P. Dialogismo, polifonia e enunciação. In: BARROS, Diana L. P. ; FIORIN, José L.  (Orgs.) Dialogismo, polifonia, intertextualidade. São Paulo, SP: Edusp, 1999, p. 7)

“no sistema da língua se imprimem historicamente as marcas ideológicas do discurso. Sabe-se que uma única língua produz discursos ideologicamente opostos, pois classes sociais diferentes utilizam um mesmo sistema linguístico. Nesse caso, deve-se reconhecer que os traços impressos na língua, a partir do uso discursivo, criam em seu interior choques e contradições que fazem Bakhtin afirmar que em todo signo se confrontam índices de valor contraditório e que, em suma, ‘o signo se torna a arena onde se desenvolve a luta de classes’” (BARROS, Diana L. P. Dialogismo, polifonia e enunciação. In: BARROS, Diana L. P. ; FIORIN, José L.  (Orgs.) Dialogismo, polifonia, intertextualidade. São Paulo, SP: Edusp, 1999, p. 8)

“Caracterizada dessa forma, a língua não é neutra e sim complexa, pois tem o poder de instalar uma dialética interna, em que se atraem e, ao mesmo tempo, se rejeitam elementos julgados incompatíveis” (BARROS, Diana L. P. Dialogismo, polifonia e enunciação. In: BARROS, Diana L. P. ; FIORIN, José L.  (Orgs.) Dialogismo, polifonia, intertextualidade. São Paulo, SP: Edusp, 1999, p. 8)

“para dele [o risco do ideologismo] escapar, é preciso, com os meios desenvolvidos pelas diferentes teorias do discurso, buscar as formas, as estratégicas, os procedimentos que fazem de um texto, mesmo dialogicamente constituído, discursos monofônicos ou polifônicos. Procedimentos diversos expõem ou escondem as variadas perspectivas do discurso, os diálogos intertextuais.” (BARROS, Diana L. P. Dialogismo, polifonia e enunciação. In: BARROS, Diana L. P. ; FIORIN, José L.  (Orgs.) Dialogismo, polifonia, intertextualidade. São Paulo, SP: Edusp, 1999, p. 9)


BRAIT, Beth. As vozes bakhtinianas e o diálogo inconcluso. In: BARROS, Diana L. P. ; FIORIN, José L.  (Orgs.) Dialogismo, polifonia, intertextualidade. São Paulo, SP: Edusp, 1999

“O investigador que não lê russo, como é o meu caso, e tomou contato com os escritos de Bakhtin a partir das traduções em doses homeopáticas, descobre, num certo ponto desse diálogo, que ‘a conversa é para teias de aranha’. Um jogo de entonações, propósitos e silêncios chega através de diferentes assinaturas – Bakhtin, Voloshinov, Medvedev – e do filtro tradutor que, confinado às especificidades de cada língua, converte-se em co-autor, multiplicando os participantes dessa prosa” (BRAIT, Beth. As vozes bakhtinianas e o diálogo inconcluso. In: BARROS, Diana L. P. ; FIORIN, José L.  (Orgs.) Dialogismo, polifonia, intertextualidade. São Paulo, SP: Edusp, 1999, p. 13)

“Bakhtin afirma que tudo que é expresso por um falante, por um enunciador, não pertence só a ele. Em todo o discurso são percebidas vozes, Às vezes infinitamente distantes, anônimas, quase impessoais, quase imperceptíveis, assim como as vozes próximas que ecoam simultaneamente no momento da fala” (BRAIT, Beth. As vozes bakhtinianas e o diálogo inconcluso. In: BARROS, Diana L. P. ; FIORIN, José L.  (Orgs.) Dialogismo, polifonia, intertextualidade. São Paulo, SP: Edusp, 1999, p. 14)

“o escritor como dramaturgo […] Para Bakhtin, toda voz autenticamente criadora só pode ser uma segunda voz dentro do discurso, na medida em que o escritor é alguém capaz de trabalhar a língua situando-se fora dela, alguém que possui o dom da fala indireta” (BRAIT, Beth. As vozes bakhtinianas e o diálogo inconcluso. In: BARROS, Diana L. P. ; FIORIN, José L.  (Orgs.) Dialogismo, polifonia, intertextualidade. São Paulo, SP: Edusp, 1999, p. 24)

“a compreensão de um enunciado é sempre dialógica, por implica a participação de um terceiro que acaba penetrando o enunciado na medida em que a compreensão é um momento constitutivo do enunciado, do sistema dialógico exigido por ele. Isso significa que, de alguma maneira, esse terceiro interfere no sentido total em que se inseriu. Esse jogo dramático das vozes, denominado dialogismo ou polifonia, ou mesmo intertextualidade, […] torna multidimensional a representação e […], sem buscar uma síntese do conjunto, mas ao contrário uma tensão dialética, configura a arquitetura própria de todo discurso.” (BRAIT, Beth. As vozes bakhtinianas e o diálogo inconcluso. In: BARROS, Diana L. P. ; FIORIN, José L.  (Orgs.) Dialogismo, polifonia, intertextualidade. São Paulo, SP: Edusp, 1999, p. 25)


FIORIN, José L. Polifonia textual e discursiva. In: BARROS, Diana L. P. ; FIORIN, José L.  (Orgs.) Dialogismo, polifonia, intertextualidade. São Paulo, SP: Edusp, 1999

“Quando o semioticista russo foi introduzido no Ocidente, provocou vivo interesse. No entanto, seu pensamento foi um pouco empobrecido. À rica e multifacetada concepção do dialogismo em Bakhtin se opôs o conceito redutor, pobre e, ao mesmo tempo, vago e impreciso de intertextualidade. Foi Kristeva quem, no ambiente do estruturalismo francês dos anos 60, pôs em voga esse conceito.” (FIORIN, José L. Polifonia textual e discursiva. In: BARROS, Diana L. P. ; FIORIN, José L.  (Orgs.) Dialogismo, polifonia, intertextualidade. São Paulo, SP: Edusp, 1999, p. 29)

“O conceito de intertextualidade concerne ao processo de construção, reprodução ou transformação do sentido.” (FIORIN, José L. Polifonia textual e discursiva. In: BARROS, Diana L. P. ; FIORIN, José L.  (Orgs.) Dialogismo, polifonia, intertextualidade. São Paulo, SP: Edusp, 1999, p. 29)

“[discurso] é o patamar do percurso gerativo de sentido em que um enunciador assume as estruturas narrativas e, por meio de mecanismos de enunciação, actorializa-as, especializa-as, temporaliza-as e reveste-as de temas e/ou figuras. O texto é unidade de manifestação. É o lugar em que os diferentes níveis […] do agenciamento do sentido se manifestam e se dão a ler. É, por isso, labiríntico e estratificado. É o lugar da relação entre imanência e manifestação.” (FIORIN, José L. Polifonia textual e discursiva. In: BARROS, Diana L. P. ; FIORIN, José L.  (Orgs.) Dialogismo, polifonia, intertextualidade. São Paulo, SP: Edusp, 1999, p. 30)

“Se distinguimos a noção de discurso da noção de texto, temos que diferençar interdiscursividade e intertextualidade. Tanto um fenômeno quanto outro dizem respeito à presença de duas vozes num mesmo segmento discursivo ou textual. No entanto, eles apresentam também diferenças.” (FIORIN, José L. Polifonia textual e discursiva. In: BARROS, Diana L. P. ; FIORIN, José L.  (Orgs.) Dialogismo, polifonia, intertextualidade. São Paulo, SP: Edusp, 1999, p. 30)

“A intertextualidade é o processo de incorporação de um texto em outro, seja para reproduzir o sentido incorporado, seja para transformá-lo. Há de haver três processos de intertextualidade: a citação, a alusão e a estilização.” (FIORIN, José L. Polifonia textual e discursiva. In: BARROS, Diana L. P. ; FIORIN, José L.  (Orgs.) Dialogismo, polifonia, intertextualidade. São Paulo, SP: Edusp, 1999, p. 30)

“O primeiro processo- a citação – pode confirmar ou alterar o sentido do texto citado. É claro que não nos interessam aqui citações de textos não-artísticos, que devem ser explícitas, ou seja, em que a fonte aparece ao pé-da-página. […] O poema de Bandeira [‘Satélite’] altera o sentido do texto de Raimundo Correia [‘Plenilúnio’], pois nega o sentido que este afirma. O início de Os Lusíadas – ‘As armas e os barões assinalados’ – cita, confirmando o sentido, o verso inicial da Eneida – ‘Arma virumque cano’.” (FIORIN, José L. Polifonia textual e discursiva. In: BARROS, Diana L. P. ; FIORIN, José L.  (Orgs.) Dialogismo, polifonia, intertextualidade. São Paulo, SP: Edusp, 1999, p. 30)

“O outro processo de relação intertextual é a alusão. Neste, não se citam as palavras […], mas reproduzem-se construções sintáticas em que certas figuras são substituídas por outras, sendo que todas mantêm relações hiperonímicas com o mesmo hiperônimo ou são figurativizações do mesmo tema. […] Os dois primeiros versos da ‘Canção do Exílio’ de Murilo Mendes aludem aos dois primeiros versos da ‘Canção do Exílio’ de Gonçalves Dias: ‘Minha terra tem macieiras da Califórnia/onde cantam gaturamos de Veneza […] O texto de Murilo faz alusão ao texto de Gonçalves Dias para construir um sentido oposto ao do poema gonçalvino, para estabelecer uma polêmica com ele” (FIORIN, José L. Polifonia textual e discursiva. In: BARROS, Diana L. P. ; FIORIN, José L.  (Orgs.) Dialogismo, polifonia, intertextualidade. São Paulo, SP: Edusp, 1999, p. 31)

“A estilização é a reprodução do conjunto dos procedimentos do ‘discurso de outrem’, isto é, do estilo de outrem. Estilos devem ser entendidos aqui como o conjunto das recorrências formais tanto no plano da expressão quanto no plano do conteúdo […] que produzem um efeito de sentido de individualização. Também a estilização pode ser polêmica ou contratual. […] [Em Carta pras Icamiabas, do Macunaíma há uma] estilização de um texto à moda de Rui, Bilac, Coelho Neto. Com essa estilização, Mário de Andrade ridiculariza a literatura brasileira do período anterior do modernismo e, por conseguinte, toda a cultura brasileira, já que esse estilo correspondia ao gosto dominante na época” (FIORIN, José L. Polifonia textual e discursiva. In: BARROS, Diana L. P. ; FIORIN, José L.  (Orgs.) Dialogismo, polifonia, intertextualidade. São Paulo, SP: Edusp, 1999, p. 31)

“A interdiscursividade é o processo em que se incorporam percursos temáticos e/ou figurativos, temas e/ou figuras de um discurso em outro. Há dois processos interdiscursivos: a citação e a alusão” (FIORIN, José L. Polifonia textual e discursiva. In: BARROS, Diana L. P. ; FIORIN, José L.  (Orgs.) Dialogismo, polifonia, intertextualidade. São Paulo, SP: Edusp, 1999, p. 32)

“A citação ocorre quando um discurso repete ‘ideias’, isto é, percursos temáticos e/ou figurativos de outros. […] Havia, nesse discurso [da situação na ditadura militar], ênfase nos percursos temáticos da moralização, da modernização, da ascenção social, da redistribuição de renda pela ‘mão invisível, da manutenção da ordem.” (FIORIN, José L. Polifonia textual e discursiva. In: BARROS, Diana L. P. ; FIORIN, José L.  (Orgs.) Dialogismo, polifonia, intertextualidade. São Paulo, SP: Edusp, 1999, p. 32)

“Todos os discursos que repetem os mesmos percursos temáticos e/ou figurativos, isto é, os que mantêm uma relação contratual, pertencem a uma mesma formação discursiva. Cabe lembrar, porém, que também podem existir relações contratuais, embora bastante tênues, entre formações discursivas distintas.” (FIORIN, José L. Polifonia textual e discursiva. In: BARROS, Diana L. P. ; FIORIN, José L.  (Orgs.) Dialogismo, polifonia, intertextualidade. São Paulo, SP: Edusp, 1999, p. 33)

“O outro processo interdiscursivo é a alusão que ocorre quando se incorporam temas e/ou figuras de um discurso que vai servir de contexto (unidade maior) para a compreensão do que foi incorporado. […] No texto ‘Sampa’, de Caetano Veloso, há os seguintes versos: ‘quando eu te encarei frente a frente, não vi o meu rosto/ é que narciso acha feio o que não é espelho’. O mito de Narciso serve de contexto para entender o sentido dos versos” (FIORIN, José L. Polifonia textual e discursiva. In: BARROS, Diana L. P. ; FIORIN, José L.  (Orgs.) Dialogismo, polifonia, intertextualidade. São Paulo, SP: Edusp, 1999, p. 34)

“A interdiscursividade não implica a intertextualidade, embora o contrário seja verdadeiro, pois, ao se referir a um texto, o enunciador se refere, também, ao discurso que ele manifesta” (FIORIN, José L. Polifonia textual e discursiva. In: BARROS, Diana L. P. ; FIORIN, José L.  (Orgs.) Dialogismo, polifonia, intertextualidade. São Paulo, SP: Edusp, 1999, p. 35)

“O discurso simula ser meu naquilo que, em si, não tem sentido, o plano de expressão” (FIORIN, José L. Polifonia textual e discursiva. In: BARROS, Diana L. P. ; FIORIN, José L.  (Orgs.) Dialogismo, polifonia, intertextualidade. São Paulo, SP: Edusp, 1999, p. 35)

“o homem está inelutavelmente preso ao outro naquilo que há de mais caracteristicamente humano, a linguagem. A alteridade é uma dimensão constitutiva do sentido. Não há identidade discursiva sem a presença do outro. Poderíamos até constituir o seguinte mote: fora da relação com o outro, não há sentido. Também nosso mote não escapa ao outro. Nele ressoa a divisa greimasiana ‘hors du texxte, pas de salut’, na qual, por sua vez, ecoa o princípio ‘Extra Ecclesiam, nulla salus’.” (FIORIN, José L. Polifonia textual e discursiva. In: BARROS, Diana L. P. ; FIORIN, José L.  (Orgs.) Dialogismo, polifonia, intertextualidade. São Paulo, SP: Edusp, 1999, p. 36)


LEMOS, Cláudia. A Função e o destino da palavra alheia. In: BARROS, Diana L. P. ; FIORIN, José L.  (Orgs.) Dialogismo, polifonia, intertextualidade. São Paulo, SP: Edusp, 1999

 

“As influências extratextuais têm uma importância muito especial nas primeiras fases do desenvolvimento do homem. Estas influências estão revestidas de palavras (ou de outros signos) e estas palavras pertencem a outras pessoas: antes de mais nada, trata-se das palavras da mãe. Depois, estas ‘palavras alheias’ se reelaboram dialogicamente em ‘palavras próprias alheias’ com a ajuda de outras ‘palavras alheias’ (anteriormente ouvidas) e, em seguida, já em palavras próprias (com a perda das aspas, para falar metaforicamente) que já possuem um caráter criativo (BAKHTIN, 1985, p. 385 apud LEMOS, Cláudia. A Função e o destino da palavra alheia. In: BARROS, Diana L. P. ; FIORIN, José L.  (Orgs.) Dialogismo, polifonia, intertextualidade. São Paulo, SP: Edusp, 1999, p. 38)

“[Há um] processo de paulatino esquecimento dos autores portadores das palavras alheias. As palavras alheias se tornam anônimas, se apropriam (de forma reelaborada, é claro): a consciência se monologiza. […] A consciência criativa, ao tornar-se monológica, se completa pelos anônimos. Este processo de monologização é muito importante. Depois a consciência monologizada como um todo único inicia um novo diálogo (com novas vozes externas) (BAKTHIN, 1985, p. 385-386 apud LEMOS, Cláudia. A Função e o destino da palavra alheia. In: BARROS, Diana L. P. ; FIORIN, José L.  (Orgs.) Dialogismo, polifonia, intertextualidade. São Paulo, SP: Edusp, 1999, p. 38)

“Tudo o que me concerne chega à minha consciência, começando pelo meu nome, vindo do mundo exterior através das palavras dos outros (a mãe, etc.), com sua entonação, sua tonalidade emocional e valorativa. Eu me conheço inicialmente através dos outros: deles recebo palavras, formas, tonalidade, para formar uma noção inicial de mim mesmo. […] Como o corpo se forma inicialmente dentro do seio materno (corpo), assim a consciência do homem desperta envolvida na consciência alheia. E mais tarde começa a aplicação sobre si mesmo de palavras e categorias neutras, isto é, a definição de si mesmo como pessoa sem relação com o eu e com o outro. (BAKHTIN, 1985, p. 360 apud LEMOS, Cláudia. A Função e o destino da palavra alheia. In: BARROS, Diana L. P. ; FIORIN, José L.  (Orgs.) Dialogismo, polifonia, intertextualidade. São Paulo, SP: Edusp, 1999, p. 39)

“As ciências exatas e naturais seriam formas monológicas de conhecimento, em que o único sujeito é o sujeito cognoscitivo que se coloca diante de seu objeto como diante de uma coisa sem voz.” (LEMOS, Cláudia. A Função e o destino da palavra alheia. In: BARROS, Diana L. P. ; FIORIN, José L.  (Orgs.) Dialogismo, polifonia, intertextualidade. São Paulo, SP: Edusp, 1999, p. 39)

“[De uma] tensão entre a autoria como instância monológica que cria personagens concluídos e a autoria enquanto espaço que se abre para que o personagem ganhe, como sujeito, a possibilidade de não coincidir consigo mesmo e de permanecer inconcluso, que emerge no livro sobre Dostoievski a oposição entre romance monológico e romance polifônico” (LEMOS, Cláudia. A Função e o destino da palavra alheia. In: BARROS, Diana L. P. ; FIORIN, José L.  (Orgs.) Dialogismo, polifonia, intertextualidade. São Paulo, SP: Edusp, 1999, p. 41)

“o texto como elo ‘na cadeia histórica da comunicação discursiva’ supõe tanto relações dialéticas entre textos e seus sentidos quanto relações dialógicas entre textos e seus sujeitos, já que ‘os sentidos se distribuem por diferentes vozes’. […] Contudo, ao contrário do que se poderia supor a partir dessa interpretação dialógica da intertextualidade, não há que identificar o autor com os sujeitos/vozes/posições interpretativas que circulam pelas palavras, pelos textos. […] o escritor, para ele paradigma do autor, [aparece] como ‘alguém que é capaz de trabalhar com a língua situando-se fora dela, alguém que possui o dom da fala indireta’.” (LEMOS, Cláudia. A Função e o destino da palavra alheia. In: BARROS, Diana L. P. ; FIORIN, José L.  (Orgs.) Dialogismo, polifonia, intertextualidade. São Paulo, SP: Edusp, 1999, p. 42)

“Dessa elaboração surge a figura do autor [polifônico] como um terceiro, identificado negativamente por não-assimilável às vozes-sujeitos que se cruzam no discurso, e que atua como um dramaturgo, ‘no sentido de que qualquer discurso aparece em sua obra distribuído entre as vozes alheias’, incluindo-se aí sua própria imagem que, por representada, não coincide com ele autor, instância de representação.” (LEMOS, Cláudia. A Função e o destino da palavra alheia. In: BARROS, Diana L. P. ; FIORIN, José L.  (Orgs.) Dialogismo, polifonia, intertextualidade. São Paulo, SP: Edusp, 1999, p. 42)


BLIKSTEIN, Izidoro. Intertextualidade e polifonia: o discurso do plano ‘Brasil Novo’. In: BARROS, Diana L. P. ; FIORIN, José L.  (Orgs.) Dialogismo, polifonia, intertextualidade. São Paulo, SP: Edusp, 1999

“Suportado por toda uma intertextualidade, o discurso não é falado por uma única voz, mas por muitas vozes, geradoras de muitos textos que se entrecruzam no tempo e no espaço, a tal ponto que se faz necessária toda uma escavação ‘filológico-semiótica’ para recuperar a significação profunda dessa polifonia.” (BLIKSTEIN, Izidoro. Intertextualidade e polifonia: o discurso do plano ‘Brasil Novo’. In: BARROS, Diana L. P. ; FIORIN, José L.  (Orgs.) Dialogismo, polifonia, intertextualidade. São Paulo, SP: Edusp, 1999, p. 46)


FÁVERO, Leonor L. Paródia e dialogismo. In: BARROS, Diana L. P. ; FIORIN, José L.  (Orgs.) Dialogismo, polifonia, intertextualidade. São Paulo, SP: Edusp, 1999

 

“Paródia significa canto paralelo (de para = ao lado de e ode = canto), incorporando a ideia de uma canção cantada do lado de outra, como uma espécie de contracanto.” (FÁVERO, Leonor L. Paródia e dialogismo. In: BARROS, Diana L. P. ; FIORIN, José L.  (Orgs.) Dialogismo, polifonia, intertextualidade. São Paulo, SP: Edusp, 1999, p. 49)

“Toda a vida da linguagem, seja qual for seu campo de emprego (a cotidiana, a prática, a científica, a artística etc.), está impregnada de relações dialógicas” (BAKHTIN, 1970, p. 240 apud (FÁVERO, Leonor L. Paródia e dialogismo. In: BARROS, Diana L. P. ; FIORIN, José L.  (Orgs.) Dialogismo, polifonia, intertextualidade. São Paulo, SP: Edusp, 1999, p. 50)

“[Bakhtin] trata da polifonia caracterizando-a como multiplicidade de vozes e consciências independentes e distintas que representam pontos de vista sobre o mundo. O romance polifônico é inteiramente dialógico e a palavra literária não pode ser tomada isoladamente, mas representa a ‘intersecção de superfícies textuais’, o diálogo de diversas escrituras, isto é, a do contexto atual e a de contextos anteriores” (FÁVERO, Leonor L. Paródia e dialogismo. In: BARROS, Diana L. P. ; FIORIN, José L.  (Orgs.) Dialogismo, polifonia, intertextualidade. São Paulo, SP: Edusp, 1999, p. 50)

“A noção de dialogismo – escrita em que se lê o outro, o discurso do outro – remete a outra, explicitada por Kristeva ao sugerir que Bakhtin, ao falar de duas vozes coexistindo num texto, isto é, de um texto como atração e rejeição, resgate e repelência de outros textos, teria apresentado a ideia de intertextualidade” (FÁVERO, Leonor L. Paródia e dialogismo. In: BARROS, Diana L. P. ; FIORIN, José L.  (Orgs.) Dialogismo, polifonia, intertextualidade. São Paulo, SP: Edusp, 1999, p. 50)

“O estatuto [do texto] é assim definido […] por dois eixos:

Horizontal: sujeito da escritura – destinatário -> instaura o diálogo

Vertical: texto – contexto -> instaura a ambivalência.

Esses dois eixos se cruzam, gerando a intertextualidade e possibilitando a dupla leitura” (FÁVERO, Leonor L. Paródia e dialogismo. In: BARROS, Diana L. P. ; FIORIN, José L.  (Orgs.) Dialogismo, polifonia, intertextualidade. São Paulo, SP: Edusp, 1999, p. 50)

“Se há duas maneiras de transmitir uma experiência – a monológica e a dialógica […] -, Bakhtin enfoca o carnaval como forma dialógica, e o discurso carnavalesco instaurando um estado de mundo dinâmico porque ambivalente e contraditório. Diferentemente do texto monológico, centrado em si mesmo, ‘oficial’, autoritário, há um outro discurso em que várias vozes dialogam (polifonia) numa intertextualidade contínua” (FÁVERO, Leonor L. Paródia e dialogismo. In: BARROS, Diana L. P. ; FIORIN, José L.  (Orgs.) Dialogismo, polifonia, intertextualidade. São Paulo, SP: Edusp, 1999, p. 50)

“Os gêneros carnavalescos ( o carnaval é a fonte cultural de onde provêm os gêneros cômico-sério-críticos) que se ajustam à forma dialógica são, segundo Bakhtin, a sátira menipeia, o diálogo socrático e o simpósio” (FÁVERO, Leonor L. Paródia e dialogismo. In: BARROS, Diana L. P. ; FIORIN, José L.  (Orgs.) Dialogismo, polifonia, intertextualidade. São Paulo, SP: Edusp, 1999, p. 52)

“‘Um autor pode usar o discurso de um outro para seus fins pelo mesmo caminho que imprime nova orientação significativa ao discurso que já tem sua própria orientação e a conserva. Neste caso, esse discurso deve ser sentido como o de um outro. Assim, num único discurso podem-se encontrar duas orientações interpretativas, duas vozes. Assim é o discurso parodístico, a estilização, o skaz estilizado’ (BAKHTIN, 1970, p. 147), porém, na paródia, ‘o discurso se converte em palco de luta entre duas vozes’ e, como num espelho de diversas faces, apresenta a imagem invertida, ampliada ou reduzida ‘arrastando o leitor para dentro ao mesmo tempo que o põe para fora’” (FÁVERO, Leonor L. Paródia e dialogismo. In: BARROS, Diana L. P. ; FIORIN, José L.  (Orgs.) Dialogismo, polifonia, intertextualidade. São Paulo, SP: Edusp, 1999, p. 53)

“Na paródia, a linguagem torna-se dupla, sendo impossível a fusão de vozes que ocorre nos outros dois discursos: é uma escrita transgressora que engole e transforma o texto primitivo: articula-se sobre ele, reestrutura-o, mas, ao mesmo tempo, o nega” (FÁVERO, Leonor L. Paródia e dialogismo. In: BARROS, Diana L. P. ; FIORIN, José L.  (Orgs.) Dialogismo, polifonia, intertextualidade. São Paulo, SP: Edusp, 1999, p. 53)

“O discurso da paródia é ambivalente: uma coisa está sempre na fronteira com o seu contrário, contradizendo-a, relativizando-a. Essa ambivalência do discurso da paródia revela-se pela comunicação entre o espaço da representação pela linguagem e o da experiência na linguagem (como correlação de textos)” (JOSEF, 1980 apud FÁVERO, Leonor L. Paródia e dialogismo. In: BARROS, Diana L. P. ; FIORIN, José L.  (Orgs.) Dialogismo, polifonia, intertextualidade. São Paulo, SP: Edusp, 1999, p. 53)


LOPES, Edward. Discurso literário e dialogismo em Bakhtin. In: BARROS, Diana L. P. ; FIORIN, José L.  (Orgs.) Dialogismo, polifonia, intertextualidade. São Paulo, SP: Edusp, 1999

 

“a arte e, particularmente, a literatura, na medida mesma em que se dirigem a um outro, seu destinatário – leitor, público – e em que sua matéria provêm de um outro sujeito, destinador – a comunidade, a classe social do artista etc. – é sempre um artefato de natureza social. Nas palavras de B. Schnaiderman, […] ‘esse dialogismo fundamental é que tem de ser levado em conta em todas as abordagens da literatura. Em essência, a linguagem é sempre dialógica. O monologismo, isto é, a concentração da obra em torno da voz do autor, constitui um artifício de que este lança mão para centrar tudo em seu próprio núcleo ideológica. A tarefa do estudioso da literatura seria desvendar esse dialogismo essencial’” (LOPES, Edward. Discurso literário e dialogismo em Bakhtin. In: BARROS, Diana L. P. ; FIORIN, José L.  (Orgs.) Dialogismo, polifonia, intertextualidade. São Paulo, SP: Edusp, 1999, p. 64)

“a tarefa da teoria da literatura não é nem pinçar, na obra literária, os ‘reflexos’ [superestruturais] da realidade extraliterária, como proclamavam os marxistas, nem chegar a descobrir como o texto foi construído, como queriam os formalistas – era, antes, tentar compreender como ocorre, nos textos da literatura, a produção do sentido: como o discurso literário vem a significar o que significa?” LOPES, Edward. Discurso literário e dialogismo em Bakhtin. In: BARROS, Diana L. P. ; FIORIN, José L.  (Orgs.) Dialogismo, polifonia, intertextualidade. São Paulo, SP: Edusp, 1999, p. 69)

“a teoria bakhtiniana da literatura radica no conceito de discurso entendido como um mecanismo dinâmico, do qual vocábulo algum pode ser compreendido em si mesmo, já que todos os termos de um texto vêm inseridos em múltiplas situações, em diferentes contextos lingüísticos, históricos e culturais; assim, para Bakhtin, um texto possui sempre um sentido plural.” LOPES, Edward. Discurso literário e dialogismo em Bakhtin. In: BARROS, Diana L. P. ; FIORIN, José L.  (Orgs.) Dialogismo, polifonia, intertextualidade. São Paulo, SP: Edusp, 1999, p. 70)

“língua nenhuma constitui um sistema semiótico homogêneo. As línguas são, inversamente, mesclas nunca inteiramente resolvidas e homogeneizadas de dialetos, socioletos, idioletos, jargões, normas e registros diversos, desse conjunto multifário e contraditório derivando a multitextualidade do discurso. Por tudo isso, o sentido de uma obra literária é fruto de uma construção dialógica” LOPES, Edward. Discurso literário e dialogismo em Bakhtin. In: BARROS, Diana L. P. ; FIORIN, José L.  (Orgs.) Dialogismo, polifonia, intertextualidade. São Paulo, SP: Edusp, 1999, p. 70)

“Em A poética de Dostoievski […] [Bakhtin faz] o esboço da primeira teoria estrutural do funcionamento intertextual da narrativa […]. E não sem razão: todas as acepções com que esse vocábulo, intertextualidade, virá a ser proferido a partir da década de 60,encontram-se já prefiguradas, em termos da própria terminologia bakhtiniana, como multidiscursividade, pluridiscursividade, dialogismo e polifonia” (LOPES, Edward. Discurso literário e dialogismo em Bakhtin. In: BARROS, Diana L. P. ; FIORIN, José L.  (Orgs.) Dialogismo, polifonia, intertextualidade. São Paulo, SP: Edusp, 1999, p. 71)

“Bakhtin é um dos primeiros a substituir o recorte estático dos textos por um modelo onde a estrutura literária não é/não está mas se elabora em relação a uma outra estrutura […] Cruzamento de superfícies textuais, diálogos de várias escrituras […] todo texto é absorção e transformação de outro texto. No lugar da noção de intersubjetividade instala-se a noção de intertextualidade” (KRISTEVA, 1970, apud LOPES, Edward. Discurso literário e dialogismo em Bakhtin. In: BARROS, Diana L. P. ; FIORIN, José L.  (Orgs.) Dialogismo, polifonia, intertextualidade. São Paulo, SP: Edusp, 1999, p. 71)

“Tudo isso [textos do começo do século de Chklovski, Tinianov e mesmo Saussure] está a demonstrar que a ideia de dialogicidade, ou da intertextualidade, como agora se prefere dizer, não é criação de Bakhtin; nem, tampouco, seria dele a melhor definição do procedimento, que talvez tenha sido fornecida pelo mesmo Chklovski, na sua Sobre a teoria da prosa […] [:] ‘de todas as influências que se exercem na História de uma Literatura, a principal é a das obras sobre as obras” (LOPES, Edward. Discurso literário e dialogismo em Bakhtin. In: BARROS, Diana L. P. ; FIORIN, José L.  (Orgs.) Dialogismo, polifonia, intertextualidade. São Paulo, SP: Edusp, 1999, p. 73)

“o próprio do romance moderno é, na concepção de Bakhtin, o seu caráter dialógico, polifônico. A ficção longa da modernidade nasce do encontro de vozes diferenciadas que se somam, se interenunciam, se contradizem, se homologam e se infirmam umas às outras – em síntese, se relativizam mutuamente. O resultado é que a intertextualidade nasce da percepção da disjunção existente entre essas duas vozes, essas duas consciências, esses dois discursos, homólogos narrativos das contradições profundas que coexistem a cada instante dentro e fora das pessoas de uma mesma coletividade” LOPES, Edward. Discurso literário e dialogismo em Bakhtin. In: BARROS, Diana L. P. ; FIORIN, José L.  (Orgs.) Dialogismo, polifonia, intertextualidade. São Paulo, SP: Edusp, 1999, p. 76)

“com a interiorização dos procedimentos de carnavalização na prosa de ficção, a literatura se torna paródica, ou seja, ambígua. Ela pode, então, voltar-se para si mesma e, desdobrada numa clave séria e numa contraclave cômica, construir-se feito um diálogo entre os dois textos do mesmo discurso que, por causa disso, deixa de servir inocentemente para expressar a ideologia manipulatória, da representação do lado (pretensamente) sério da vida […] – semelhante discurso, dialógico e portanto dialético como é, vem expressamente para denunciar a manipulação embutida em qualquer ideologia de representação” (LOPES, Edward. Discurso literário e dialogismo em Bakhtin. In: BARROS, Diana L. P. ; FIORIN, José L.  (Orgs.) Dialogismo, polifonia, intertextualidade. São Paulo, SP: Edusp, 1999, p. 77)

“[o discurso dialógico] se torna profundamente polifônico, pois várias instâncias discursivas acabam por nele fazerem-se ouvir. O que Bakhtin ouve nessa parole não é uma linguística. É a divisão do sujet cindido de início, já que constituído pelo seu outro, e daí múltiplo e inapreensível, polifônico. A linguagem de um determinado romance é o território onde se ouve esse desmantelamento do eu – seu polimorfismo. A ciência dessa polifonia será, pois, uma ciência da metalinguagem, mas não uma linguística: Bakhtin chama-a metalingüística (KRISTEVA, 1970, p. 13 apud LOPES, Edward. Discurso literário e dialogismo em Bakhtin. In: BARROS, Diana L. P. ; FIORIN, José L.  (Orgs.) Dialogismo, polifonia, intertextualidade. São Paulo, SP: Edusp, 1999, p. 78)

o textual é de natureza intertextual, visto que o ‘discurso encontra o discurso do outro em todos os caminhos que conduzem ao seu objeto e ele não pode deixar de entrar em interação viva e intensa com ele’ (BAKHTIN, 1981)” (LOPES, Edward. Discurso literário e dialogismo em Bakhtin. In: BARROS, Diana L. P. ; FIORIN, José L.  (Orgs.) Dialogismo, polifonia, intertextualidade. São Paulo, SP: Edusp, 1999, p. 77)

“O homem não possui um território interior soberano, ele se situa todo e sempre em uma fronteira: olhando para o seu interior, ele o olha nos olhos do outro ou através dos olhos do outro” (BAKHTIN, 1981 apud LOPES, Edward. Discurso literário e dialogismo em Bakhtin. In: BARROS, Diana L. P. ; FIORIN, José L.  (Orgs.) Dialogismo, polifonia, intertextualidade. São Paulo, SP: Edusp, 1999, p. 79)

“[A] obra [de Bakhtin] pode ser vista sem desdouro numa perspectiva de continuidade histórica, como reelaboração e aggiornamento de velhos temas. Temas que podemos fazer remontar à teoria anagramática que Saussure rascunhava por volta de 1900, ou até mesmo às doutrinas medievais acerca do signo, àquelas, pelo menos, que começavam por isolar como fundadora da semiose intra-sígnica, isto é, como criadora de uma relação entre um significante e um significado, exatamente a instalação de uma relação dialógica entre um elemento in praesentia (sintagmática) e um elemento in absentia (paradigmática) no discurso: os sistemas de signos são intertraduzíveis, pensavam os escolásticos, porque nenhum elemento deles pode funcionar semanticamente sem remeter necessariamente a um outro elemento ausente do discurso mas presente no sistema, ou seja, sem remeter necessariamente a um outro elemento ausente cuja ausência mesma é posta em evidência pela presença manifesta do outro significante: sempre que aliquid stat pro aliquo estamos na presença do signo e do discurso. Aí estão, embrionariamente, em seu nacessodouro, os fundamentos dos temas das intercitações, da paródia e do dialogismo que os formalistas, primeiro, Bakhtin, depois, irão desenvolver em nosso século [XX], conferindo-lhes uma importância e um alcance até então insuspeitados, no âmbito de uma teoria intertextual da literatura que está longe, ainda, de ter produzido seus melhores frutos” (LOPES, Edward. Discurso literário e dialogismo em Bakhtin. In: BARROS, Diana L. P. ; FIORIN, José L.  (Orgs.) Dialogismo, polifonia, intertextualidade. São Paulo, SP: Edusp, 1999, p. 80)

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